Já de um tempo, tenho circulado por São Paulo em busca de alguns letreiros. Isso é parte do que eu estudo e tenho pesquisado no doutorado. A ideia de que uma palavra, que é sempre performance, é mais performance quando se projeta sobre o espaço público, como rastro de alguém que disse, dizendo ainda. Onde há palavra, uma voz sussurra. A palavra ecoa a voz de algum performer.
Desde o começo do século passado, com a instalação do primeiro letreiro em néon, numa barbearia de Paris, a palavra acesa seduziu, assustou e encantou quem, como nós, anda com medo da cidade escura. Dá para imaginar o que era a noite nas sociedades de “pequena escala”, iluminada pelo céu. O frio era mais frio. E o tempo, mais interminável.
Por isso, venho experimentando alguns movimentos com a palavra pública, para chamá-la de algum nome (apesar de que toda palavra que sai da gente torna pública alguma parte nossa). Nesse terreno borrado, entre a publicidade e uma sensibilidade que poderia ser associada à arte, redescobrimos não apenas a palavra como imagem, uma magia que torna presente o ausente, que acende mentalmente uma ideia; mas a palavra como ação, como gesto performativo, como um corpo que diz e encena, de longe.
Sugeri, para alunas e alunos fabulosos para quem dou aula, a ideia de escrever sobre acontecimentos dos que nos protegemos no mês em que estivemos sem aula. Usamos um pouco a ideia do italiano Cavellini, que, a partir dos anos 70, praticou o que chamou de autostoricizzazione. Usava os corpos das pessoas para inscrever as histórias delas mesmas. De algum modo, fizemos isso com os nossos medos. Na linha do que Maui trazia no corpo, em Moana.
Após registrar algumas vulnerabilidades nossas, o grupo de alunos reuniu, em alguns títulos, uma síntese do que apareceu escrito sobre os corpos. De certa forma, como saída paradoxal para o que normalmente guardamos com a gente, propus, desde o início, que essas tentativas de proteção fossem exibidas num letreiro luminoso instalado na janela do meu apartamento.
O letreiro, agora, está aberto a colaborações. Durante este segundo semestre, vai explodir feito biribinha.