Logo nas primeiras páginas de O ano em que vivi de literatura, tive a impressão de que Paulo Scott não escreveu o livro para ganhar prêmio. E isso é curioso: primeiro, porque narra o ano vivido por um escritor às custas de um grande prêmio literário; depois, porque é um romance que se faz ótimo nos detalhes da leitura - e, por detalhes, me refiro a algumas sequências nas escolhas dos títulos dos capítulos e, até mesmo, na insistência em algumas passagens que têm o mesmo propósito: mostrar que a trama anda, inclusive quando parece não andar.
E por que o livro fugiria da bula dos prêmios? Porque vai na contramão de todo o politicamente correto e a boa-mocice que, feicebuquianamente, tomaram conta do Brasa nos últimos anos. Mundo literário incluído, com louvor.
Scott fala de um escritor desencaminhado após o primeiro lugar no concurso literário com o maior prêmio do país. Com a promessa de viver de literatura, o protagonista abandona a carreira de professor universitário e passa todo o ano ocupado com fodelanças infinitas e com o vitrinismo de seus poemas, no Facebook. No percurso, que às vezes ameaça ser maçante, descobrimos que o ritmo do texto constrói o tempo do próprio narrador, sujeito tão dos nossos dias, refém dos slogans de um Brasil que estava dando certo e daquela armadilha - que costuma falhar no final - de viver do que se gosta.
Conforme acompanhamos o ano do protagonista, ainda que diversos elementos pareçam nos encaminhar para o lado contrário - talvez seja machista e egoísta -, alguma coisa no texto, possivelmente a circularidade e a redundância dos acontecimentos, que sublinham nossa impotência diante do mundo, acaba trapaceando a tentação de uma leitura reta e blasé, e estabelece uma azeda identificação com o personagem: machuca não saber perder.
De repente, me dei conta de que a solidão de Graciliano tinha muito da minha solidão, e de que o fardo sisífico de querer que as coisas terminem bem é a pior condenação que qualquer pessoa pode ter.
A vida fracassa, mermão. Mesmo a vida que a gente edita no feice e inventa na literatura.